Os efeitos do consumo de álcool na performance esportiva

O álcool é a droga psicoativa mais difundida e ingerida mundialmente, atingindo 16,5% da população que a bebe semanalmente, sendo seu consumo na forma pura equivalente a 4,3L por ano. A bebida alcóolica é vista como uma recompensa aos atletas pelo trabalho duro realizado durante os treinos e jogos competitivos ou como uma tradição do clube esportivo por causa de vitórias ou da entrada de novos jogadores para o time.

Dados em estudantes parcialmente ou totalmente envolvidos no esporte, jogadores de Liga e União de Rugby e futebol australiano, este consumo é visto de forma mais intensa e excessiva, os quais são mais propensos a ficarem embriagados, além da frequente intoxicação gerada nos homens devido ao consumo de nove vezes mais álcool do que o recomendado por dia, sendo 10 vezes maior comparado às mulheres.

De acordo com a WHO, recomenda-se o consumo de 4 medidas de bebida alcóolica por dia pelos homens e 2 pelas mulheres, sendo cada medida ideal referente à 8-14g de álcool. Nos casos em que o consumo pelos homens seja de 4 a 6 medidas ou pelas mulheres de 2 a 4 há o aumento de riscos à saúde mental e fisiológica, tornando-os passíveis do desenvolvendo de doenças, como câncer, hipertensão e derrame. Entretanto, mesmo sendo aconselhado a abstinência de seu consumo pelos atletas, estes não o consideram prejudicial à saúde e performance como consideram as outras drogas distribuídas. Dessa forma, é necessário reeducá-los objetivando a compreensão do impacto negativo à performance, recuperação e saúde geral para que possam aderir à uma rotina alimentar coerente com a prática de exercício físico.

Estudos mostraram o efeito do consumo de diversas quantidades de álcool antes da realização de exercícios e descobriu-se que:

  • A ingestão de 0,44 e 0,88 ml/kg peso com 95% de etanol não houve efeitos significativos, porém 0,5g/kg de massa livre de gordura de álcool diminuiu o trabalho realizado em ciclistas de competições de duração de 1 h;
  • 25 ml de álcool 10 minutos antes e 30 minutos depois do exercício impediu com que ¾ dos corredores terminassem a corrida;
  • 1g de álcool/kg aumentou a perda de força tipicamente relacionada ao exercício excêntrico extenuante e a concentração de 0,01 mg/ml e 0,1 mg/ml aumentou o tempo de duração para realizar provas em corridas de 200m, 400m, 800m e 1,5km

Além do mais, o consumo de álcool impacta vários aspectos relacionados à prática esportiva considerados componentes essenciais à performance e recuperação. Primeiramente, quando realizado de forma aguda, observa-se prejuízo na potência, velocidade e ação muscular e cardiovascular em exercícios de endurance, não sendo analisado mudanças nos exercícios anaeróbicos. Todavia, o consumo máximo de oxigênio pelo atleta, seu batimento cardíaco, o volume sistólico, a circulação sanguínea no músculo esquelético e a dinâmica respiratória não são afetados, bem como a força muscular mesmo após altas doses.

Já depois do exercício, a redução dos estoques de glicogênio muscular e hepático e a desidratação podem prejudicar a performance em situações em que o período de recuperação não for seguido por estratégias nutricionais corretas, como a reposição eletrolítica e hídrica devido a perda de fluidos de, aproximadamente, 2 a 5% do peso corporal e a ingestão de carboidrato, principalmente entre os treinos de sessões seguidas, otimizando o período de recuperação. Entretanto, os atletas geralmente optam por beberem após os treinos e competições ao invés de seguirem as orientações propostas, consumindo quantidades de carboidrato insuficientes.

Além disso, os efeitos diuréticos de doses de, no mínimo, 4% de álcool dependem do status de hidratação do atleta, estando reduzido em pacientes com hipohidratação. Contudo, somente doses altas relaciona-se ao aumento da diurese e consequente diminuição da normalização da taxa volumétrica do sangue, retardando a recuperação do estado desidratado do atleta.

Assim, em casos nos quais a reposição de fruídos não é uma prioridade, pode-se permitir com que os atletas consumam maiores doses de álcool, tendo em mente que quanto mais baixa a concentração menor o efeito, como em 0,4g/kg de álcool. Já o álcool consumido antes do exercício impacta na gliconeogênese hepática e na absorção e utilização de glicose, prejudicando a performance, mas quando consumido após, não altera a ressíntese de glicogênio muscular ocorrida depois do exercício. Dessa forma, o consumo de álcool após o exercício (1,5 g/kg), levando em consideração sua influência ao glicogênio muscular, deve ser feito em conjunto com o consumo de carboidrato.

O sistema imune é o responsável pelas respostas pró-inflamatórias à traumas e lesões ocorridas durante o exercício físico, sabe-se que a ingestão aguda de álcool gera alterações nas células imunológicas, como na atividade das citocina, interleucina (IL)-1b, expressão da IL-6 e limitações ao transporte de neutrófilos à região inflamada. Assim, o consumo crônico de álcool compromete o sistema imune desenvolvendo maior suscetibilidade à doenças e infecções, cenário intensificado através da promoção da imunossupressão causada pelo exercício físico.

O consumo de álcool antes de exercícios em que traumas foram gerados tem sido associado à incapacidade de limitar a chegada de sangue na lesão, contribuindo para a formação de edema e para o retardo da recuperação do atleta. Dessa mesma forma, ele impacta na recuperação e adaptações musculares devido ao impacto na síntese proteica mesmo em atletas com boa saúde nutricional, bem como na qualidade e duração do sono por meio do impacto direto no processo fisiológico ou indiretamente como resultado da duração das confraternizações noturnas, por exemplo, enquanto consome a bebida alcóolica. Esta privação de sono não demonstra alterar a performance anaeróbica, porém pode-se observar em exercícios de endurance, uma possível redução da sensação de dor durante uma boa noite de sono.

Sabe-se também que a alteração hormonal gerada pelo consumo de álcool é capaz de causar o desequilíbrio no sono e nas funções cardiovasculares. O consumo agudo de 1,5g/kg, principalmente na fase de recuperação e dos processos adaptativos em exercícios aeróbicos, possui efeitos negativos na produção de testosterona nos homens, aumentando sua transformação em estrógeno, desenvolvendo a ginecomastia e atrofia testicular, além de afetar a densidade óssea e a composição das células vermelhas. Todavia, o consumo de 0,83g/kg após exercícios resistidos altera a elevação de cortisol, aumentando o tempo de estado catabólico, sem impactar nos níveis de testosterona.

Portanto, o álcool impacta diversas funções que são essenciais na performance, adaptações e recuperação dos atletas após os treinos e competições, sendo sua dose e ‘timing’ capazes de diferir no desenvolvimento de consequências negativas ao atleta.

Fonte: BARNES, M. J. Alcohol: impact on sports performance and recovery in male athletes. Sports Medicine, v. 44, n. 7, p. 909-919, 2014.

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