Extrato de beterraba rico em Nitrato para Performance Física

Conteúdo extraído (em parte) do capítulo 28 do Tratado de Nutrição Esportiva

O óxido nítrico (NO) é um composto bastante estudado para a performance esportiva devido a seus vários efeitos, como vasodilatador, melhora do fluxo sanguíneo, oxigenação muscular, redução da pressão arterial e possibilidade de aumento da conversão de fibras tipo II.

Há muito tempo já se sabe da geração de NO por meio da oxidação de L-arginina em L-citrulina, através das enzimas da família das NO sintases (NOS). Porém, essas enzimas são dependentes de oxigênio e, em estado de redução deste, como nos exercícios de alta intensidade, a produção de NO seria prejudicada. No entanto, posteriormente foi demonstrado que existe também a produção de NO a partir no nitrato (NO3) e nitrito (NO2), independentemente da ação das NOS, ou seja, sem a necessidade de presença de oxigênio, o que é importante, justamente por isso, nos exercícios de alta intensidade.

O suco de beterraba (Beta vulgaris) tem sido muito estudado e utilizado como suplemento devido ao seu alto teor de nitrato. Quando ingerido, o nitrato é reduzido a nitrito por bactérias anaeróbicas facultativas, da própria cavidade oral, pela ação de enzimas nitrato redutase. Chegando ao estômago, em meio ácido, o nitrito é decomposto instantaneamente, de forma não enzimática, em NO e outros óxidos de nitrogênio. O nitrato e o nitrito remanescentes são absorvidos do intestino para a circulação, que podem se tornar NO bioativo em tecidos, inclusive sangue, sob hipóxia fisiológica. Podem ser excretados pelos rins (25 a 75%) ou entram no ciclo enterosalivar, por meio das glândulas salivares (25%) e reinicia-se o ciclo. Devido à alta taxa de eliminação na urina e saliva, a concentração de nitrato plasmático fica reduzida e, sendo assim, torna-se importante a ingestão de nitrato para produção de NO em situações de hipóxia.

O NO induz vários mecanismos fisiológicos que influenciam a utilização de oxigênio (O2) durante a contração do músculo esquelético e mecanismos fisiológicos para a redução de nitrito são facilitados por condições de hipóxia; portanto, o NO (vasodilatador) é produzido nas partes do músculo que estão consumindo ou precisando de mais O2. Esse mecanismo permitiria que o fluxo sanguíneo local se adaptasse às exigências de O2, provendo ao músculo esquelético uma distribuição homogênea e adequada. É importante salientar que níveis adequados de vitamina C e polifenois contribuem no processo de conversão a NO, mais um ponto em favor da beterraba, que possui muitos polifenois. Clifford e colaboradores mencionaram, inclusive, que a utilização de suco de beterraba seria mais eficiente que a suplementação isolada do nitrato, na melhora da dor muscular, em exercícios excêntricos, justamente pela presença desses polifenois.

   São várias as funções do NO, como vasodilatação, regulação do fluxo sanguíneo, citados anteriormente, melhora do VO2, biogênese e respiração mitocondrial, absorção de glicose e contração/relaxamento muscular, levando à melhora da função muscular esquelética e consequente melhor performance cardiorrespiratória.

   O nitrato faz parte da lista dos cinco suplementos aprovados pelo American College of Sports Medicine (ACSM), com efeitos na tolerância ao exercício e melhora na performance em desportistas, através da produção do NO, efeitos vasculares e metabólicos que reduzem o consumo de O2 durante o exercício.

Os benefícios agudos são vistos normalmente entre 2-3h após o consumo de nitrato e o consumo crônico (maior que 3 dias) parece ser mais indicado para atletas, nos quais se torna mais difícil obter os benefícios do suplemento, devido às adaptações fisiológicas que já ocorreram com os exercícios. Sobre a comparação dos efeitos do uso agudo ou crônico do nitrato, Vantahalo dividiu oito homens saudáveis em dois grupos, sendo um consumindo 500ml de suco de beterraba e o outro placebo, por 15 dias, realizando um protocolo de exercícios com testes de moderada a alta intensidade. O objetivo era comparar os efeitos da suplementação aguda (2,5h antes do exercício) ou crônica, após cinco dias e após 15 dias de suplementação. Os resultados mostraram melhora do VO2 no grupo suplementado de forma aguda ou crônica, porém, a potência só melhorou com a suplementação crônica após 15 dias.

Em relação à suplementação de nitrato para exercícios de alta intensidade, os efeitos ergogênicos parecem ocorrer pela diminuição do consumo de O2, aumento da biogênese mitocondrial, eficiência da respiração mitocondrial, melhora da contração muscular ou até possível modulação de fibras tipo II. Sobre isso, De Smet e colaboradores demonstraram um aumento significativo de fibras do tipo IIa em um grupo suplementado com nitrato (6,45mmol por cinco semanas), quando comparado com grupo placebo, ambos tendo realizado testes em hipóxia.

Esses achados contribuem para a hipótese de que o nitrato possui efeitos ergogênicos comprovados em exercícios intermitentes de moderada a alta intensidade, como futebol, rúgbi, tênis, basquete, algumas modalidades de atletismo, como os 100, 200 ou 400 metros rasos, além do treinamento de força e exercícios prolongados, melhorando tempo até a exaustão. Seu consumo por meio do suco de beterraba é bastante eficiente, desde que se atinja a concentração mínima necessária para isso. Quanto aos benefícios para atletas, cabe avaliar a possibilidade de uma dose mais alta para obter os mesmos benefícios nesse público.

 

Referências

  1. Erzurum SC, Ghosh S, Janocha AJ, Xu W, Bauer S, Bryan NS, et al. Higher blood flow and circulating NO products offset high-altitude hypoxia among Tibetans. Proc Natl Acad Sci U S A. 2007;104(45):17593-8.
  2. Smith LW, Smith JD, Criswell DS. Involvement of nitric oxide synthase in skeletal muscle adaptation to chronic overload. Journal of applied physiology (Bethesda, Md : 1985). 2002;92(5):2005-11.
  3. Moncada S, Higgs A. The L-arginine-nitric oxide pathway. N Engl J Med. 1993;329(27):2002-12.
  4. Benjamin N, O’Driscoll F, Dougall H, Duncan C, Smith L, Golden M, et al. Stomach NO synthesis. Nature. 1994;368(6471):502.
  5. Lundberg JO, Weitzberg E, Lundberg JM, Alving K. Intragastric nitric oxide production in humans: measurements in expelled air. Gut. 1994;35(11):1543-6.
  6. Murphy M, Eliot K, Heuertz RM, Weiss E. Whole beetroot consumption acutely improves running performance. Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics. 2012;112(4):548-52.
  7. Duncan C, Dougall H, Johnston P, Green S, Brogan R, Leifert C, et al. Chemical generation of nitric oxide in the mouth from the enterosalivary circulation of dietary nitrate. Nature medicine. 1995;1(6):546-51.
  8. Lundberg JO, Govoni M. Inorganic nitrate is a possible source for systemic generation of nitric oxide. Free radical biology & medicine. 2004;37(3):395-400.
  9. Bailey SJ, Winyard P, Vanhatalo A, Blackwell JR, DiMenna FJ, Wilkerson DP, et al. Dietary nitrate supplementation reduces the O2 cost of low-intensity exercise and enhances tolerance to high-intensity exercise in humans. Journal of Applied Physiology. 2009;107(4):1144-55.
  10. Lundberg JO, Weitzberg E, Gladwin MT. The nitrate–nitrite–nitric oxide pathway in physiology and therapeutics. Nature Reviews Drug Discovery. 2008;7(2):156-67.
  11. Pannala AS, Mani AR, Spencer JP, Skinner V, Bruckdorfer KR, Moore KP, et al. The effect of dietary nitrate on salivary, plasma, and urinary nitrate metabolism in humans. Free radical biology & medicine. 2003;34(5):576-84.
  12. Jones AM. Dietary nitrate supplementation and exercise performance. Sports Medicine. 2014;44(Suppl 1):S35-S45.
  13. Clifford T, Howatson G, West DJ, Stevenson EJ. Beetroot juice is more beneficial than sodium nitrate for attenuating muscle pain after strenuous eccentric-bias exercise. Applied physiology, nutrition, and metabolism = Physiologie appliquee, nutrition et metabolisme. 2017;42(11):1185-91.
  14. Domínguez R, Cuenca E, Maté-Muñoz JL, García-Fernández P, Serra-Paya N, Estevan MCL, et al. Effects of beetroot juice supplementation on cardiorespiratory endurance in athletes. A Systematic Review. Nutrients. 2017;9(1):E43.
  15. Maughan RJ, Burke LM, Dvorak J, Larson-Meyer DE, Peeling P, Phillips SM, et al. IOC consensus statement: dietary supplements and the high-performance athlete. British Journal of Sports Medicine. 2018;52:439-55.
  16. Thomas DT, Erdman KA, Burke LM. American College of Sports Medicine Joint Position Statement. Nutrition and athletic performance. Medicine and science in sports and exercise. 2016;48(3):543-68.
  17. Loureiro LL, Santos GBd. Nitrato: suplementação, fontes dietéticas e efeitos na performance. Revista Brasileira de Nutrição Funcional. 2017;71:7-16.
  18. Larsen FJ, Schiffer TA, Borniquel S, Sahlin K, Ekblom B, Lundberg JO, et al. Dietary inorganic nitrate improves mitochondrial efficiency in humans. Cell metabolism. 2011;13(2):149-59.
  19. Bailey SJ, Fulford J, Vanhatalo A, Winyard PG, Blackwell JR, DiMenna FJ, et al. Dietary nitrate supplementation enhances muscle contractile efficiency during knee-extensor exercise in humans. Journal of applied physiology (Bethesda, Md : 1985). 2010;109(1):135-48.
  20. Jones AM, Ferguson SK, Bailey SJ, Vanhatalo A, Poole DC. Fiber Type-Specific Effects of Dietary Nitrate. Exerc Sport Sci Rev. 2016;44(2):53-60.

De Smet S, Van Thienen R, Deldicque L, James R, Sale C, Bishop DJ, et al. Nitrate intake promotes shift in muscle fiber type composition during sprint interval training in hypoxia. Frontiers in physiology. 2016;7:233.

Posts relacionados