O hemograma é um instrumento de avaliação do estado físico dos atletas, de suas adaptações aos exercícios e de possíveis intervenções necessárias para que quadros que prejudicam a saúde e a performance sejam evitados, como lesões, deficiências nutricionais e a detecção do doping sanguíneo realizado de forma indireta, mantendo a saúde e o desempenho dos esportistas.
Sabe-se que os treinamentos de endurance geram adaptações ao organismo, sendo uma delas o aumento do volume de oxigênio inspirado durante o exercício e que estratégias como o treino em altitudes elevadas, resultam no aumento da concentração da hemoglobina, observado através dos exames de sangue. Todavia, a presença de nutrientes que fornecerão energia e cofatores que participam da síntese proteica, como o ferro, ácido fólico, vitaminas do complexo B, zinco, cobre e magnésio são determinantes para esse aumento e permitem com que a adaptação seja realizada de forma a beneficiar a performance.
Entretanto, mesmo diante desse aumento, esse exercício pode desenvolver uma pseudoanemia ou anemia por hemodiluição, a qual se refere à expansão do volume plasmático devido a adaptação corporal, diminuindo a quantidade de eritrócitos comparado aos indivíduos sedentários ou que praticam treinos resistidos. Além disso, os quadros de anemia também reduzem essa quantidade no sangue, impactando negativamente o desempenho e a recuperação dos atletas. Portanto, além da observação dos hemogramas, é importante analisar os índices eritrocitários e realizar a contagem dos reticulócitos para o diagnóstico correto dos atletas e uma rápida intervenção.
Além do mais, o reticulócito, célula sanguínea imatura, é um parâmetro no diagnóstico de anemia, doping e adaptações nos atletas. Neles, os níveis encontram-se elevados após o treino e quando convertido em eritrócito, permanece no sangue por 100 dias devido ao aumento na renovação das hemácias pela prática de exercício físico. Todavia, diante da deficiência de ferro promovida pelo seu uso pelos macrófagos para oxidação em resposta ao estímulo inflamatório do exercício e consequente redução da absorção, há redução do conteúdo de hemoglobina do reticulócito (Ret-He), podendo indicar anemia.
Já em busca pelo controle antidoping, a Agência Mundial Antidopagem apresentou o passaporte biológico do atleta, o qual exige a realização de exames hematológicos e esteroidais para a avaliação da presença de substâncias, como estimulantes de eritropoiese amplamente encontrados no mercado atual e a prática da transfusão autóloga, os quais, aumentam o conteúdo de reticulócitos no sangue podendo ser observado no resultado do exame (IRF) e indicar dopagem realizada pelo atleta.
Sendo assim, essas análises sanguíneas devem ser feitas depois de, no mínimo, 2 dias da execução do exercício, pois ele é capaz de interferir nos resultados, elevando a viscosidade do sangue até 6 horas depois de sua prática, estabilizando os glóbulos brancos e as plaquetas somente após 24 horas e expandindo o volume plasmático nas 48 horas seguintes. Já os reticulócitos não são alterados significativamente em treinos de endurance de intensidade moderada, somente após treinos intensos, sendo rapidamente ajustados.
Ainda, os parâmetros bioquímicos devem ser observados durante as várias fases de competição devida à mudança biológica ocorrida no organismo entre esses períodos, ressaltando a importância de avaliar o atleta e comparar os dados obtidos ao longo da trajetória esportiva, principalmente de durante (‘in season’) e fora (‘off season’) da competição. Analisou-se que nos treinos muito intensivos de atletas de endurance e no fim de temporada de jogadores de futebol, os níveis de reticulócitos estão diminuídos no sangue desses esportivas comparado ao obtido no período pré-competição.
Portanto, o hemogramada é importante no diagnóstico do estado de saúde do atleta e ajudam na detecção de casos de anemia e, de forma indireta, do doping sanguíneo. Entretanto, deve-se aprofundar as análises dos parâmetros, como realizar a contagem de reticulócitos, para se obter diagnósticos mais claros quanto a situação do atleta e comparar os resultados de durante e entre competições, além de realizá-los no período correto após o exercício, evitando possíveis alterações geradas pela adaptação do organismo ao exercício físico.
Fonte: NUNES, L. Novos parâmetros hematológicos no controle antidoping e monitoramento de atleta: Importância da avaliação hematológica em atletas e praticantes de atividade física. Sysmex, 2021.